quinta-feira, 1 de julho de 2010

Uma resposta: em defesa de Georges Politzer, Plínio de Arruda Sampaio e do Psol.

Uma amiga me monstrou este link de um blog chamando o Psol de partido neo-stalinista com base na opção do partido em recomendar a leitura de um livro de Geoges Politzer chamado "Princípios elementares de Filosofia".: http://diariogauche.blogspot.com/2010/07/seria-o-psol-um-partido-neo-stalinista.html

Fiz uma resposta o mais cordial possível por achar que é um debate que traz uma série de formulações muito caras aos movimentos emancipatórios hoje.

Aqui vai:

A Crítica é falha pelo seguinte:

Em primeiro lugar a crítica desconsidera que quase todo o marxismo brasileiro foi stalinista. E isso por um motivo muito simples: a doutrina marxista que chegou ao brasil chegou pelas mãos do Partidão com orientação ideológica do marxismo oficial. São poucos os marxistas não-stalinistas no Brasil. Em segundo lugar que quer dizer quando se diz que um livro é stalinista? Que existe uma "essência" totalitária na teoria? O problema desse argumento é que ele cai numa espécie de "armadilha ontológica". O Stalinismo vulgarizou em grande parte, é verdade, o marxismo. Mas isto de forma nenhuma quer dizer que as contribuições stalinistas ou os alinhamentos teóricos stalinistas (e o mais famoso deles é o Lucácks de História e Consciência de Classe) sejam por si só ruins e deterministicamente totalitários enquanto objeto de estudos e reflexão.

Em segundo lugar: algumas coisas não foram ditas em relação ao Politzer. Em primeiro lugar, quando ele diz "esta obra que sequer foi escrita pelo Politzer" ele dá a entender que se trata de um fato contingente, que das obras de filosofia marxista do politzer, entre tantas, esta especificamente é uma compilação de anotações de alunos dos seus cursos de filosofia marxista. Mas o problema é que este compêndio de filosofia marxista foi uma "compilação de anotações" justamente porque foi resultado do trabalho de Georges Politzer na Universidade Proletária, projeto militante francês de intelectuais marxistas que ministravam cursos básicos de formação em filosofia para operários e abertos também ao público estudantil. E portanto a estrutura da obra é eminentemente oral (como diga-se de passagem são os seminários de Lacan) como todas as obras de Politzer resultantes de seus cursos de filosofia na Universidade Proletária. O que é claro faz concluir que muito provavelmente o que nosso querido crítico enxerga como a vulgarização da filosofia marxista, nada mais é do que o curso militante oferecido pelo franco-húngaro, juntamente com outros intelectuais marxistas, a trabalhadores de chão de fábrica da franca na década de 40 (até que de Gaule proibiu as atividades da referida Universidade) e omitido por ele na sua crítica.

Outro fato que, se bem não tem a ver com o caráter stalinista ou não da teoria marxista de Politzer, ainda é importante demais para ser omitido, é que Politzer foi um dos responsáveis pela promoção da psicanálise na frança e considerado pelo próprio Lacan (já que falei do método oral comum tanto aos Princípios Elementares de Filosofia quanto aos seminários lacanianos) um mestre através do qual o psicanalista francês teve seu primeiro contato com a obra freudiana e o saber psicanalítico. Este fato, ou antes a omissão dele, faz da crítica ao Politzer como um pensador vulgar ela própria uma crítica vulgar. A importância do pensamento de Politzer como intelectual militante para a história do pensamento francês no século XX vai um pouco além da mera panfletagem tosca e acrítica do regime stalinista.


Em terceiro lugar: não sei se o nosso crítico é ele próprio um petista envergonhado, coisa muito comum hoje em dia. Mas que fique claro, os desvios do PT não tem absolutamente nada a ver com formulações stalinistas do marxismo. Por isso não faz o menor sentido dizer que "Nem o PT, com todos os seus desvios de percurso, chapinhou na lama enganosa do marxismo vulgar do stalinismo." O PT não chapinhou na lama enganosa do marxismo vulgar do stalinismo, porque o PT há muito tempo não chapinha no marxismo, seja ele trotskista, stalinista, leninista, castrista, guevarista, maoísta etc. E isso simplesmente porque o PT não está construindo uma estratégia revolucionária rumo ao socialismo, mas gerindo a pós-política tão comumente propagada após a queda do muro.

Por último, quando ele pergunta "Será que o velho Plinião, candidato à presidência da República pelo partido neo-stalinista, sabe disso?", sinceramente eu não sei. Não tomei café da manhã com o Plínio. Mas arriscaria a resposta "sim, e daí?". O Plínio não é só um testa de ferro, um instrumento de manobra na mão de um partido controlador. Dizer isso é faltar com respeito à própria figura do Plínio cuja sabedoria teórica no campo do Marxismo vai da economia política marxista, da filosofia marxista ortodoxa, passando pela teologia da libertação até os filósofos marxistas contemporâneos (como Zizek, de quem o Plínio traduziu alguns textos; e Alain Badiou, a quem ele cita frequentemente nas entrevistas e debates). Plínio não é uma peça de museu com importãncia estratégica no tabuleiro político. Ele pensa a política do seu partido. Ele sabe.

E se o Plínio está num partido que recomenda a leitura de uma obra tão importante na história do pensamento e da militância socialista, é porque seu partido está construindo uma estratégia revolucionária rumo ao socialismo, projeto que o PT abandonou há muito tempo. E é por isso, e somente por isso, que o "nem o PT" recomenda a leitura de Geoges Politzer, de Lucácks ou dos textos sobre linguìstica do próprio Stalin.

De qualquer forma, só é possível evitar o stalinismo incorporando o fracasso das suas experiências mal sucedidas e a legitimação teórica-ideológica que as sustentaram. Este discurso de "evitar o mal maior virando as costas para o que pode ser o seu germe" é a mesma postura de Habermas/Bento XVI de evitar o mal maior da dissolução ética do homem virando as costas para a biogenética, fingindo que ela não existe. Postura teoricamente incontinente e politicamente conservadora.

4 comentários:

Raphael Gorny disse...

Terminei agora a pouco um livro chamado "Stalin - Um Novo Olhar" do Ludo Martens.

Não dá pra concordar com tudo, já que o autor é um stalinista mais fanático do que eu sou pelo Coxa, mas dá pra ter uma boa idéia de que nem tudo que é dito sobre o stalinismo corresponde à verdade.

Se ainda não tiver lido, vamos marcar uma cerveja e eu te jogo na mão.

Abraço

Andre disse...

/\ eu q vendí.

Tecelão disse...

Nos dias de hoje, é necessário ser, não digo prolixo, mas vasto ou até excessivo, porque as pessoas não mais lêem meias palavras. É também necessãrio ser cordial, porque o sucinto é quase sempre visto como agressão. Mas eu apenas responderia que num mundo em que ninguém lê bosta nenhuma, quanto mais guias mao-marxistalinistas ou seja lá como o chamem, recomendar leituras nunca faz mal, e nem pode deflagrar rotulações. Afinal, se é verdade que se é aquilo que se lê ou que se come, mais verdade é que se é aquilo que se faz.

E, convenhamos... Não há como haver política com cultos à personalidade como esses. Stálin, Mao, Lênin, não foram deuses. E para quem venha com diretos de esquerda, já afirmo que quem dá a lição é Fidel. Por essas e outras, recomendo nada mais do que o Dao'de'Jing de Lao-Tse.

Unknown disse...

Olá,
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www.plinio50.com.br