segunda-feira, 8 de junho de 2009

O Conceito de Entendimento Político

Em Hegel, ao contrário da noção vulgar que se tem de seu pensamento, o Absoluto não é a reconciliação harmônica das contradições.

Se há alguma "reconciliação" no Absoluto, esta é, pura e simplesmente, a idéia de que o Absoluto é a própria contradição, e ela vive, como tal, no Absoluto. Por isso a máxima hegeliana: "não há nada no céu e na terra que não contenha o ser e o nada". O Absoluto, entã, é a contradição última: aquela entre ser (o conceito mais abrangente) e o nada (o conceito menos abrangente).

Logo, a Razão é, diretamente, a contradição.

Oposto à Razão está o Entendimento como poder de limitação e princípio de identidade. O Entendimento é a contradição não como Unidade, tal qual se realiza no Absoluto, na Razão, mas a contradição como termos opostos e fixados como independentes um do outro e existentes em si mesmo, e por isso, idênticos.

Isto é o que aproxima o Entendimento da lógica do masculino em Lacan: uma idéia apoiada na exclusão de sua exceção, na contradição da idéia posta fora da própria idéia e não dentro dela, como na Razão.

Entendimento Político, portanto, diz respeito a uma ordem política dada, ou antes à sua manifestação como ideologia, que se apóia na exclusão radical daquilo que lhe nega.

O Entendimento Político contemporâneo é a Democracia que, como tal, só se sustenta e se desenvolve pela absoluta exclusão de seu oposto: O Totalitarismo. E o procedimento lógico e racional é identificar diretamente esta contradição como Unidade: Democracia é Totalitarismo. Como todo Entendimento Político, ele é o poder de limitação de uma dada operacionalidade política que fixa os termos opostos do antagonismo social como termos independentes e existentes em si mesmos sendo, portanto, princípio de identidade/identificação.

Não é atoa que Kojin Karatani, em sua interpretação de Marx, afirma que a Democracia é a Ditadura da burguesia sob a forma do sufrágio universal: nele todos os indivíduos podem se fazer representar politicamente anulando, assim, as relações de classe que se manifestam na esfera da produção. Neste sistema, o indivíduo só é livre mediante eleições que suspendem as contradições reais de classe.

E não é a toa, também, que a Democracia, hoje, fale tanto em identidades, sbretudo por meio da sua maior agência ideológica no plano teórico: A Teoria da Sociedade do Risco. Se há identidades opostas no mundo, elas não são independentes, caso contrário, não haveria movimento dialético no mundo.

O que a crítica de esquerda deve fazer, portanto, é tentar achar na contradição das mútliplas identidades e naquilo que podem opor umas as outras uma Unidade no seio da própria contradição, de forma que se possa identificar o momento sintético destas Unidades em relação ao Uno do Entendimento político que se instaura na ordem do Caos e da contingência.

É isto que permite a Zizek em sua aula The Reality of the Virtual aproximar a diferença entre Esquerda e Direita como a diferença sexual no edifício teórico lacaniano: uma diferença que pré-existe aos próprios termos a que se refere, de forma que não é possível falar da diferença (ou de seu pretenso desaparecimento) senão por um dos termos. E é claro que se a idéia que se pauta na exclusão de sua exceção é a lógica masculina, necessariamente, esta é a postura identificada com o status quo comum às posturas conservadoras e liberais. Por outro lado, dar cabo da contradição como gênese ontológica da idéia é a postura feminina identificada diretamente com a esquerda.

A Esquerda, hoje, necessita deste processo dialético, do qual parece ter se distanciado nestes últimos anos, em busca da superação do Entendimento Político que, enquanto se desenvolva como tal, é Morto e estéril, incapaz de articular o não-senso de onde se criam suas próprias contradições no seio de seus movimentos particularizados.

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