domingo, 13 de setembro de 2009

MP3, Comunismo e outras coisas.

Ideologicamente, vivemos em um tempo muito estranho.
A questão do Cinismo, trazida para discussão, no Brasil, em primeira mão por Vladimir Safatle, demonstra como a Democracia, hoje, pode ser sustentada (e funciona muito bem assim) sem que ninguém acredite piamente na democracia. Todos nós sabemos que a democracia não funciona, mas parecemos crer em alguém que crê na democracia de forma que não podemos pensar nenhuma realidade para além da lógica democrática.

De forma peculiar, portanto, vivemos no tempo politicamente mais conformista da história, ao mesmo tempo em que não esperamos nada do regime político e econômico vigente. E assim, a democracia e o Capital atuam livremente, percebidos como lógicas naturais etenras e imutáveis de relações sociais e humanas. Neste sentido, o Capital é pensado como uma força que atingiu a indestrutibilidade quando conseguiu atingir uma dimensão Global. Mas como diria Zizek, isto demonstra no máximo uma posição privilegiada do Capital, jamais sua indestrutibilidade eterna.

Mas, além disso, fica claro que é precisamente porque o Capital é global que seus antagonismos são elevados à última potência, deixando a ele uma posição muito mais instável. Sintomático disto é a questão da propriedade intelectual. Ora, um dos motivos da expansão global do Capital é justamente o desenvolvimento tecnológico das comunicações, mais especificamente da internet. Mas a internet como forma de circulação de mercadorias virtuais gera o problema da insustentabilidade da propriedade intelectual, uma espécie de mercadoria que não tem consistência física e que, por isso mesmo, não pode ser consumida fisicamente e só vale enquanto informação virtual que, por isso mesmo, pode ser copiada e pirateada. Nas palavras de Zizek, a propriedade intelectual é inerentemente Comunista e não é a toa que as empresas que produzem softwares e outros bens virtuais gastam muito mais dinheiro combatendo a pirataria de seus produtos do que desenvolvendo os produtos propriamente. Se o valor de toda a mercadoria oscila como num gráfico de batimento cardíaco, o valor da propriedade intelectual parece um ataque cardíaco. Neste sentido, captamos um ato falho da ultra-direita fundamentalista norte americana (Recording Industry Association of America) que revela muito dessa estrutura antagônica do Capital. Apesar da intenção conservadora, o poster revela muito de verdade.

A resistência ao Capital deve se ater nestas fraquesas, nestas inconsistências da dinâmica de mercado, e se o Capital se organiza globalmente, também a resistência tem, pela primeira vez, a capacidade de se organizar globalmente.

E, só para lembrar a frase de Zizek: Socialismo = todo o poder aos sovietes + livre acesso à internet.

3 comentários:

Fernando Marcellino disse...

ia bom ver um post exatamente sobre essas inconsistencias do mercado global. De qualquer forma, quando falamos da inerencia comunista da propriedade intelectual talvez seja baseado num deslocamento do capitalismo em relação a propriedade privada, como Marx havia descrito como um momento de negação da negação do capital.

Chrysantho Sholl Figueiredo disse...

A propriedade privada como "negação da negação" do Capital? Como assim?

Fernando Marcellino disse...

No Capital III, Marx escreve qeue com o desenvolvimento máximo das forças produtivas, "há produção privada, sem o controle da propriedade privada". O capitalista não se prende mais a sua relação com a propriedade privada pelo desenvolvimento de uma espécie de produção que se descola da propriedade privada e que abre as portas para uma transformação qualitativa da própria propriedade.